À escrivaninha. 22°C lá fora. Tarde clara com céu de um azul indiscritível salpicado de nuvenzinhas brilhantes. Lembro-me de que tenho claridade em minha vida. Tanta luz que ofusca as trevas que teimam em rondar meu coração.
Há dezessete anos tenho um anjo…
A tradicional frase: “o tempo cura tudo” ainda não tem sentido para mim. Absolutamente nada mudou. Em todos estes anos, amanheço como se fosse aquele em que me despedi de seu corpo. Não me despedi de sua alma.
É impossível esquecer o filho que se perde. E não quero esquecer, pois, esta sim, seria uma dor maior que a própria morte: não ter mais sequer a sua lembrança. Continuo pensando e agindo exatamente como há dezessete anos. Vivendo a vida de verdade, não uma vida artificial e de aparências. Valorizando cada momento, como se fosse o último. Intensamente.
São dezessete anos de lágrimas contidas nunca choradas. Basta uma música, uma roupa, uma situacão corriqueira que costumava protagonizar, para que a tristeza me invada. Ele está aqui, comigo, o tempo todo.
Houve um dia, anos atrás, em que sonhei que ele chegava de mansinho e me abraçava. Acordei sentindo a força de seu abraço. Tão real e tão arrepiante…
Um segundo adeus
Ontem ele foi remanejado de onde descansava para uma urna. Cedeu lugar, no jazigo da família, a outro anjinho que se foi. Não fui assistir. Um segundo sepultamento seria doloroso demais. Sozinha, em casa, revivi cada sensação daquele dia, há dezessete anos. E, desta vez, também, as lágrimas não vieram. Continuam aqui, enterradas, no fundo do coração.
Certa vez, um amigo, o Allan, escreveu-me, após ver uma foto de meu menino: “Espero que seu filho tenha realmente virado um anjo, pois seria o anjo com o sorriso mais bonito do paraíso.” Então, lembrei-me de seu sorriso. De sua alegria. De sua ternura, E sossseguei.
E a lembrança deste sorriso devolveu-me a alegria e a esperança de reencontrá-lo um dia (sim, eu creio na ressurreição). E é este sorriso que trago em meu coração. Uma imagem para sempre gravada em minha memória.
O amor nunca morre
E esta dor nunca passa. A saudade e a falta dele e da juventude que não viveu são coisas que doem, mas, certamente, “Deus dá forças extraordinárias quando sobre nós sobreveem provações que não podemos suportar”.
Para os que pensam que recordar a perda de um filho é sinal de loucura, saibam que, pelo contrário, recordar é algo que precisa continuar vivo, para que se mantenha o equilíbrio da mente e do espírito.
O conforto consiste em crer que ele está em um lugar preparado, muito lindo e especial. E que eu o reencontrarei um dia. Enquanto isso, olho as estrelas, à noite, e sorrio.
Sim, eu tenho um anjo que me sorri das estrelas.
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