À escrivaninha. 19°C lá fora. Céu azul cinzento com grandes borrões de nuvens. Sinto muito frio. Minhas mãos estão congeladas. Vem, Primavera, por amor!
Há algumas semanas, alterei o modo de iniciar o meu dia. Antes, pulava da cama e ia fazer barulho na cozinha, em busca de café. Agora, gosto de ficar em silêncio, antes que os ruídos da vizinhança interfiram em minha paz de espírito. Permaneço quieta e não faço nada.
Aproveito esse momento de calma para agradecer e me concentrar na leitura de algumas páginas de um livro. Depois, preparo o café, faço exercícios, e, então, me sento para escrever. Eu valorizo esse meu tempo sozinha, à escrivaninha, em frente à janela, de manhã cedo. Com minha xícara de café, observo o canto dos pássaros e o aspecto do céu, anunciando um novo dia.
A pandemia me aproximou de mim mesma e passei a me concentrar mais em meus pensamentos. A quarentena amplificou o tempo e o espaço que a aposentadoria já havia me proporcionado. Tenho passado mais tempo refletindo e registrando minhas impressões sobre a vida após a meia idade.
Às vezes, escrevo publicamente no blog. Outras vezes, em meu diário de reflexões absolutamente pessoais.
Há eventos da vida real difíceis de articular. É difícil saber o quanto compartilhar e como isso poderá se refletir em nós e nos outros.
Escrever em um diário pessoal funciona como uma tentativa de reviver ações e palavras que me marcaram o suficiente para eu refletir sobre elas. Penso que escrevo para o meu próprio bem, quando consigo expressar como me sinto sobre as pessoas e sobre o que me fizeram ou me disseram.
Ao relê-las – e faço isto frequentemente, analiso as situações que me afetam, positiva ou negativamente, sem julgamentos, com distanciamento e imparcialidade, para tentar enxergar as coisas com mais clareza.
Não quero me sentir vulnerável quando escrevo, principalmente sobre como os outros me trataram ou como me senti em relação a eles. É difícil ser honesta e ficar vulnerável. Então, prefiro honrar os outros. E permito que minha vulnerabilidade ganhe destaque apenas em meus escritos pessoais.
É possível que, com o tempo, eu ganhe força e coragem para contar minhas histórias sem me preocupar com a dor que uma palavra escrita possa causar em alguém? Acredito que não. Escrever coisas em um diário e protegê-lo não é desonestidade.
É discrição.