Sobre ser mãe de anjo

À escrivaninha. 26ºC lá fora. Céu cinzento e uma brisa outonal levanta as cortinas em minha janela.

Anos atrás, encontrei uma mensagem no antigo Twitter, em que uma pessoa me marcou. Havia um link para um post fazendo referência a um texto meu em que faço reflexões a respeito da perda de meu filho e sobre a graça de ser mãe de um anjo. Confesso que me senti confortada e proporcionalmente abalada.

Em um trecho do post, a pessoa afirma que, em qualquer tipo de perda se permite o tempo de luto para enterrar o acontecido, a decepção, o sonho perdido, para depois se reerguer e renascer. Significa que um dia a dor acabará? Fiquei pensando sobre isso alguns minutos, mas, dentro de mim, sentia que a dor da perda de um filho é eterna. Não vislumbrava um “tempo” de luto para apagar tudo e me reerguer.

A dor tem tempo de validade?

Refleti um pouco sobre a função do velório das pessoas que amamos. Cantamos hinos na cerimônia que falam de ressurreição, vida e descanso eterno. O ministro faz uma leitura bíblica e traz uma palavra de conforto aos vivos e não aos mortos. Faz-se uma a oração. O corpo volta ao pó e todos retornam a suas vidas. E tudo se acaba.

E tudo se acaba? De jeito nenhum! O amor nunca morre. E esta dor nunca passa. Em meu coração e em minha memória aquele momento é atual. Como se acordasse de novo, todo dia, com a notícia que dividiu minha vida em antes e depois.

Se o tempo cura todas as feridas, ainda não me curou. Sabem por quê? Porque a morte de um filho não é uma ferida. É uma mutilação. Uma parte do coração arrancado não sara nunca.

Mãe-órfã

É impossível esquecer o filho que partiu. E uma mãe não quer esquecer. Seria uma dor maior que a própria morte não ter mais sequer a sua lembrança.

Esta semana, sonhei com ele duas vezes. Fazia tempo que não o via. Esses momentos em que posso vê-lo vivo, ouvir sua voz, sentir a presença dele são indizíveis. Sempre acordo triste. Mas feliz, porque sei que lá, acima das estrelas, ele me sorri.

O conforto consiste em crer que ele está em um lugar especial. E que eu o reencontrarei um dia. Até lá, a lembrança de sua imagem ficará para sempre gravada em minha memória, em meu coração, em minha mente, em minha vida.

Mãe-órfã. Mãe de anjo.

Eternamente.

Foto de Usukhbayar Gankhuyag na Unsplash

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