À escrivaninha. 26°C lá fora. Céu azul intenso com as costumeiras nuvenzinhas alvas. O ventilador de teto tenta bravamente fazer o papel que nenhuma brisa se dignou a fazer. Verão mostrando a que veio.
Há algo nesta fase da vida que me policio a fazer todos os dias: selecionar os potenciais distratores para a minha mente. Prestar atenção no que é alvo de meu interesse é fundamental para a memória, tanto para armazenar novas informações que são importantes para mim, quanto para recordar as antigas. A atenção seletiva a alguns estímulos enquanto ignoro outros, melhora o meu desempenho e permite que os conteúdos mentais sejam processados de forma mais eficiente.
Esquecer e se sobrecarregar
Entretanto, com todo este cuidado, ainda me surpreendo trocando datas e horárias, esquecendo tarefas essenciais a meus projetos, perdendo o foco durante a execução de um trabalho e prejudicando o rendimento ao fim do dia. A mente insiste em divagar para o passado e reviver dores e prazeres, ou se projetar para o futuro, alimentando preocupações e incertezas, quanto ao que ainda está ou não por vir.
Às vezes penso em diminuir as atribuições que deleguei a mim mesma. Tantos clubes de leitura para administrar, tantos cursos que insisto em fazer, tantas oficinas a oferecer, tantas encargos a que me propus assumir, tantos projetos de escrita a desenvolver. São atividades prazerosas que me preenchem a alma e alimentam meu cérebro, sim. Entretanto, há muito, deixaram de ser atividades de lazer na aposentadoria e se transformaram em, de certa forma, obrigações, já que existem prazos e obrigações a serem cumpridos.
Prestar atenção e permanecer invisível
Com tantas atribuições, vejo-me cercada de pessoas. E me obrigo a prestar mais atenção às reações que provoco. Meu discurso, meu comportamento, meu semblante. Percebo suspiros, virar de olhos, silêncios significativos, interrupções e indiferença. Às vezes, a invisibilidade é tão evidente que a vontade é de sumir. Das vistas, dos ouvidos, dos lugares.
Meu antídoto a tal sensação de obsolescência e inutilidade é refugiar-me no silêncio. E prestar atenção. Para me lembrar do que é interessante para mim. E esquecer o que não me acrescenta alegria.
Foto de Thomas Kinto na Unsplash