À escrivaninha. 34°C lá fora. Céu com algumas nuvens em uma tarde ensolarada. Gosto deste sol, deste céu azul, desta brisa. Que lindeza é este clima de setembro. Tudo do que precisamos para ser felizes está em nós mesmos. Esta é uma frase comumente usada para explicar a “solteirice”, especialmente de mulheres.
Por algum tempo, após ter ficado viúva, recebi “cobranças” por eu não ter casado novamente. Com insinuações maliciosas — do tipo “não tá namorando? Mentira, tá escondendo.” —, as pessoas me questionavam por que não estava com alguém.
Mas tudo que acontece na vida tem um momento e um destino; viver é uma arte, é um ofício, só que precisa cuidado pra perceber que olhar só pra dentro é o maior desperdício; o teu amor pode estar do seu lado. O amor é o calor que aquece a alma; o amor tem sabor pra quem bebe a sua água…
Nando Reis.
Eu não usava a tal frase para justificar minha solterice. Apreciava o silêncio e deixava os curiosos (aká intrometidos) no vácuo. Incomodava-me esta imposição social de ser algo absolutamente necessário que eu tivesse um parceiro para todo mundo ver. Minha independência e liberdade significava que tinha uma vida de aventuras capaz de detonar minha reputação na família perfeita?, perguntava-me.
E havia quem se dignasse ao cúmulo de sugerir possíveis candidatos. Quase sempre alguém viúvo ou divorciado, bem de vida, com filhos pequenos, e sozinho há algum tempo. Sem preconceitos a quem tenha o perfil citado, mas, por que as solteiras de plantão ainda não haviam “fisgado” o bom partido? A resposta é bem óbvia, não acham?
Chegam a ser engraçados tais questionamentos sobre a vida afetiva da mulher sozinha (viúva, separada, divorciada). Na verdade, o que querem saber não é exatamente por que estamos sozinha (entenda-se “ter um marido”), mas sim, como resolvemos nossas “necessidades” afetivas. Hilária e cruel a hipocrisia humana.
Uma amiga divorciada me contou que foi rejeitada em um grupo religioso composto por mulheres, e o argumento da líder foi: “no meu grupo não tem mulher sem marido”. Outra amiga, após a morte do ex-marido, de quem já estava divorciada há vários anos, ouviu do padre a pérola: “agora você já pode comungar, pois está viúva”.
É irritante como as pessoas não aceitam bem uma mulher sozinha. Certa vez, quando recém-viúva, em um casamento, na hora de a noiva jogar o buquê, alguém gritou-me para que eu fosse disputá-lo. Achei ridículo. Em outra ocasião, um ex-namorado reapareceu com conversa de casamento. Foi um tal de gente dizendo que já era hora mesmo, que eu estava precisando de alguém, essas coisas. Ficamos uns tempos juntos. Mas acho que minha independência o assustava. Não ter o controle o incomodadava. E era isso, não era outra coisa.
Juventude e beleza são pré-requisitos?
Eu era jovem quando fiquei viúva e não descartava a ideia de ter um novo relacionamento. Se as coisas fluíssem sem interferências sociais, familiares, ou afins, eu considerava a possibilidade de ter alguém novamente. Conheci alguns interessados (mulheres na vitrine), mas, por diversas razões não me casei novamente ou tive outro parceiro com quem valesse a pena dividir a vida. Optei por permanecer solteira.
“O problema é que você não presta atenção à sua volta”, sempre me dizia uma amiga. “O amor pode estar do seu lado”. Acho que ela andava ouvindo muito Jota Quest, hehe. Eu respondia que não olhava mesmo, pois os homens interessantes já deviam estar com alguma mulher maravilhosa e os disponíveis não eram exatamente o que eu levaria para casa. Mas, se um dia eu mudasse de ideia e viesse a conhecer alguém com quem valhesse a pena dividir a vida, consideraria a possibilidade. Caso contrário, continuaria sozinha, o que era muito bom também.
Os anos se passaram e continuei solteira. Hoje em dia, creio que seja mais complicado encontrar alguém para dividir a vida. Mesmo que eu quisesse um parceiro, dificilmente encontraria alguém que valesse a pena. Sabem por quê? Os homens de verdade, companheiros, maduros, etc, já estão comprometidos com outras mulheres maravilhosas e, obviamente, mais jovens.
Conheço algumas poucas amigas da minha idade que encontraram um homem maduro e estão juntos há muitos anos. Entretanto, os homens mais velhos, via de regra, ao se divorciarem ou ficarem viúvos, casam de novo com mulheres muitos anos mais novas e casadoiras. Aliás, este perfil é mais “estético”, diga-se de passagem, pois temos beleza e inteligência por dentro e por fora, concordam? E eu me pergunto: até quando?
Será que mulheres maduras não possuem mais o perfil desejado pelos homens dispostos a casar ou a conviver? É um pré-julgamento, um “estigma” que nós mulheres teremos de carregar?
Não sou a única
Muitas mulheres já aderiram a esta independência: estar sozinha, não dar satisfação a ninguém, decorar ou bagunçar a casa do jeito que bem entender, entrar e sair sem dar explicações, ler ou assistir à tevê até altas horas (com o controle remoto, he he), dormir e acordar à hora que quiser (se não for trabalhar, é claro), essas coisas…
É claro que, às vezes, há uma certa melancolia por não termos uma pessoa permanente, mas nem dá tempo de sentir solidão. Traçamos planos para fazer as coisas de que gostamos e que, provavelmente, se tivessemos marido ou namorado, seria um pouco difícil (em alguns relacionamentos é quase impossível) de conseguir.
Saímos para almoçar com minhas amigas e ficamos horas conversando, sem preocupação, e, muitas vezes nos surpreendemos durante muito tempo olhando vitrines, folheando livros em uma livraria, andando simplesmente, em um passeio tranqüilo. E não ter ninguém nos apressando, nem nos ligando e nos monitorando dá uma sensação de alívio.
Ser sozinha não significa ser solitária
Hoje, após a meia-idade, posso dizer, sem sombra de dúvida, que sou uma mulher diferente, uma nova mulher. Sou livre, tão livre quanto o pode ser uma mulher. Posso viajar, fazer cursos, trabalhar à noite, ou simplesmente sair livremente, e ser feliz sem compromisso. Não ser dependente emocionalmente dá uma sensação de alívio.
Talvez isso dificulte qualquer abordagem por parte de alguns homens. As mulheres independentes são assustadoras. Um chegou a me dizer que minhas conexões virtuais, e-mails, bate-papos etc iria prejudicar o relacionamento. Ele queria uma mulher off-line. Desconectada. Dispensei-o.
Estar curtindo esta fase é maravilhoso, porém estou consciente de que ninguém suporta viver só. O ideal é, durante este tempo, aprender a nos conhecer, a nos amar, a nos valorizar. E, quando aparecer alguém com quem nos conectemos, seremos melhores, interessantes, livres, mas sem perder a ternura e a feminilidade.
O amor pode estar ao meu lado? Talvez. Essa não é uma prioridade. Acredito que posso ser feliz sem a obrigação de ter um homem a meu lado. Viver minha vida de acordo com o que me faz bem. Não estou desistindo de viver um relacionamento. Sei que, às vezes, temos de começar tudo de novo. Mesmo assim, ainda acreditando que mereço algo melhor, que não nasci para viver sozinha, que preciso recomeçar a sonhar, por enquanto, prefiro me entregar a projetos que me preencham a alma, me deixando mais leve, mais confiante.
Este é um post opinativo em que expus ideias, reflexões e impressões pessoais sobre a dificuldade de ter um relacionamento após a meia-idade. Quase um ensaio. Problematizei, sim, algumas questões, focadas em minha opinião e pautada em minha experiência. Há controvérsias? Certamente. Sinta-se à vontade para expô-las, gentilmente, nos comentários.